sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Falando em sistema......

Uma pequena palavra de João Ubaldo Ribeiro (membro da academia brasileira de letras), sobre o sistema ao qual foi questionado no post anterior pelo meu amigo Uriel.


JOÃO UBALDO RIBEIRO - A guerra que não vai acabar

Ao que parece, o ser humano (quase escrevo "serumano", neologismo que, 
quem sabe, pode vir a ser adotado, pois outro dia ouvi na TV que um casal 
era "dois serumanos") precisa, pelo menos de vez em quando, alterar sua 
percepção da chamada realidade, mexer com a própria mente e as emoções. 
Prisioneiro de seus cinco limitadíssimos sentidos, não consegue perceber, 
em condições normais, aquilo que suspeita ou sabe existir além deles.
E quer sair da prisão, quer sensações que ordinariamente não estão a 
seu alcance. Outra necessidade, que corre paralela, é alterar o comportamento
habitual e quem for tímido tornar-se extrovertido, quem for melancólico tornar-se
alegre, a moça que hesita em dar resolver dar e assim por diante.
Para obter esses estados alterados de percepção e comportamento, o famoso
ser humano não usa somente drogas. Muitos lhes devotam aversão ou
medo e recorrem a vias diferentes. Se forem poetas, poetam; se não forem,
embarcam na poesia pelas mãos dos poetas. Ou veem o mundo pelos olhos
dos pintores e fotógrafos. Ou meditam, ou contemplam a natureza, ou ouvem
música, esta última considerada por alguns tão potente que Platão, por exemplo,
a baniu de sua República. Aliás, não falta quem condene a música, ou certos tipos
de música, por crer que ela induz à depravação e à expressão de temíveis baixos
instintos. E, como as experiências com esses alteradores da consciência não são
excludentes entre si, o ser humano desfruta de várias delas,entrando no que se
designa genericamente como "barato".
Os baratos, de mil e uma formas e em mil e uma nuances, podem ocasionar diversos
tipos e graus de transtorno, não só em quem os experimenta como naqueles que com
este se relacionam. Não há de ser outra a razão por que tantos deles são proibidos e 
têm o comércio, ou mesmo uso, das drogas que os causam punido até com a morte. 
Não obstante, com toda a repressão, as drogas proibidas continuam a ser vendidas e 
existe muita gente que acha que seu barato vale o risco de uma longa prisão ou de 
execução.Não vem ao caso especular sobre as razões para isso, mas cabe um raciocínio econômico
singelo: é fenômeno universal a oferta aparecer assim que aparece a demanda. 
Havendo nariz para cheirá-lo, haverá pó.
Ou seja, enquanto existir demanda, existirá quem forneça drogas. Não há nenhuma 
novidade nesta constatação, mas a guerra ao narcotráfico, contrariando todas as 
evidências, continua a tentar neutralizar a oferta e nada faz quanto à demanda. 
Esta jamais deixará de existir, mas pode, por uma fração mínima do que se gasta em
repressão, ser razoavelmente controlada. Então por que será que verdade tão 
patente é descartada? Por que será que se continua a mover essa sangrenta 
guerra, tão vã e, sobretudo, tão dispendiosa?
Porque não interessa vencê-la e muito menos acabá-la. Quem pensa que interessa 
somos nós, o otariado. Não me refiro a indivíduos, mas ao que pode ser chamado 
de "sistema". Existe um vastíssimo sistema relacionado à repressão ao narcotráfico, 
composto não só pelas polícias genéricas e especializadas, mas por todas as estruturas 
criadas para colaborar nessa repressão. É a lógica de sua existência, através da 
qual têm sido mantidas e são diuturnamente ampliadas. Nacional e internacionalmente, 
esse aparato, que envolve desde ministérios e forças armadas a polícias de aldeias, 
tem como premissa que se deve combater um inimigo que se sabe que nunca será 
vencido, combate este com um número cada vez maior de frentes e custos cada vez 
mais elevados.
Claro, não é apenas esse mostrengo, cujo aparato intrincado e labiríntico não dá 
para ser inteiramente mapeado, que resiste, funcional e corporativamente, à mudança. 
O interesse sistêmico em manter-se tem que ser levado em conta, mas ainda maiores 
que ele são os interesses dos fornecedores, diretos e indiretos, de equipamentos e 
serviços. Corre muito dinheiro na guerra contra o tráfico e cairá o queixo de quem 
apurar na ponta do lápis o custo total apenas da operação do Alemão e sua 
manutenção com tropas federais. Os produtores e vendedores de armamento têm 
vivido grandes dias no Rio de Janeiro, o mercado só tende a ampliar-se, até mesmo 
com a propaganda.
Muito mais dinheiro ainda é movimentado pelo tráfico, que repassa seus custos ao 
consumidor, como é a prática empresarial de praxe. Se não houvesse repressão, 
esses custos baixariam vertiginosamente. Quem perderia? Não somente os vendedores 
de armas e equipamentos bélicos, mas os corruptos de todos os níveis e quilates. 
Para quem pensa que isso é coisa de Terceiro Mundo, lembre-se a corrupção 
policial nos Estados Unidos, durante a vigência da Lei Seca. E, somente em Nova York, 
os casos de corrupção policial envolvendo drogas fazem parte de um prontuário 
considerável. Em alguns países, a corrupção nem ao menos tenta manter as
 aparências, como muitas vezes ocorre aqui, mas é institucionalizada e contamina 
toda a cadeia a que se vincula.
A corrupção está disseminada em toda parte, não somente no sistema brasileiro, 
como no do mundo inteiro, em maior ou menor grau. Se não houver tráfico e a guerra
santa contra ele, onde ficarão os ganhos dos corruptos, que não terão por que exigir 
comissões, subornos e propinas? É tolerável perder essa fonte de renda, em muitos 
casos milionária? Receio que não, e o mercado continuará a funcionar esplendidamente, 
para a felicidade harmoniosa de seus agentes, num entrelace delicado, em que o 
traficante agradece à repressão por lhe proporcionar um ramo de negócios lucrativo, 
a repressão e seus instrumentos agradecem ao traficante por fazê-los 
prosperar e o corrupto agradece a ambos pelo rico dinheirinho malocado 
em contas secretas. "O mundo é perfeito", sempre diz meu amigo Benebê, em 
Itaparica. Isso mesmo.

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Foi Deus quem criou?


Vamos falar de um tabu em nosso país, vamos falar de drogas, uma em especial, a cannabis sativa, popularmente conhecida como marihuana, ganja, chá, ungege, ambrosia ou simplesmente maconha.
Acredito que escrever um texto analisando fatos, já tendo conclusão favorável ao assunto, possa de alguma forma influenciar a minha forma de escrever, pois bem, foda-se, direi o que penso, entretanto me retendo aos fatos.
A maconha como todos sabem é o psicotrópico ilícito mais utilizado em nosso país (e em todos os outros que o proíbem), em 2006 a ONU levantou uma pesquisa dizendo que uma em cada 25 pessoas da idade entre 15 e 64 anos no mundo já experimentaram maconha, o que em pratica quer dizer, uma chance de 100% de alguém já ter fumando na sua sala de aula, seja no colegial ou na faculdade. Significa também que há uma chance de 4 % de um familiar ser ou já ter sido um usuário (se você vive em uma família de quatro pessoas), e por fim significa que é impossível você não ter um conhecido, amigo, parente ou qualquer outro tipo de vinculo que não tenha fumado maconha. Com tudo isso quero dizer simplesmente que a canabis sativa esta presente em nossas vidas, queiramos nós ou não.
A verdade é que para os “caretas” pouco se sabe sobre o assunto, e a ignorância destes leva a cometer erros brutais sobre o assunto. Um dado curioso constatado por mim é que nenhuma pessoa que não fume maconha sabe o real motivo da campanha de repressão na década de 30 que se sustenta ate hoje, apesar de isto ser um dado histórico (aos interessados assistir Grass - O filme).  O que me leva a perguntar, por que elas não sabem?
O fato é que as pessoas foram impregnadas da idéia de que a maconha é a pior das drogas e que em suma, só faz mal para a sociedade, com uma campanha de lavagem cerebral ao longo das décadas de 30 ate 80, quando a ONU admitiu que estiva errada em equiparar a cannabis sativa a drogas como cocaína e crack, mas em 50 anos de repressão a idéia já estava implantada. Longe de mim querer dizer que seja algo 100% bom, mas deve se fazer perguntas básicas como; Quem mata mais?  Maconha ou cigarro? Maconha ou álcool? O uso da maconha ou a sua política de repressão? E por fim, essa erva traz algum beneficio a nossa sociedade?
(uso a palavra matar como exemplificação de mal maior, a questão em si é, quem causa mais problemas)
A origem da cannabis sativa é obscurecida em nossa sociedade, coisas interessantes que poderiam levar as pessoas a uma visão diferente sobre o uso desta planta, não só para lazer, como para comercio, saúde e tecnologia. É factual que as velas das caravelas que colonizaram a America eram feitas de cânhamo (uma fibra confeccionado a partir de algumas partes da erva) e que o cânhamo  é uma fibra com resistência muito superior a qualquer uma das fibras sintéticas conhecidas, o que torna possível por exemplo que sua roupa, sapatos, lenços ou qualquer outro utensílio durem uma media de 5 a 10 anos á mais. No entanto acredito que ninguém tenha sido informado sobre isso na quarta serie. Se você se pergunta por que, a resposta é simples; a indústria de bens não duráveis é o setor comercial, mas rentável no mundo, é conveniente aos proprietários delas que esse tipo de informação não seja divulgado. Também factual são as referencias na bíblia a palavra “kalamo”, “cálamo” ou “cana” (traduzido como maconha) citados nos textos de Isaias ou de Salomão que chega a comparar o cheiro de sua mulher com fragrâncias como canela açafrão e kalamo (Cântico dos Cânticos 4:8-14). Essas entre outros milhares de informações são ofuscadas pelo argumento que “maconha é uma droga que só serve pra deixar as pessoas doidonas”
 A ONU divulgou em 2008 que o consumo de cannabis sativa tem crescido a uma faixa de 160% nos últimos quatro anos, o que deixa claro que a atual política de repressão vem se mostrando ineficaz. No simpósio nacional realizado há algumas semanas atrás pela ABESUP (Associação Brasileira de Estudos Sociológicos do Uso de Psicoativos) foi relembrada uma campanha com o seguinte slogan “Os traficantes são a favor da proibição da maconha, e você?”. Não é necessário nenhuma super habilidade para se raciocinar que quando o poder paralelo zela pela manutenção de uma lei instituída pelo Estado, algo de muito errado esta acontecendo.